Boas práticas e desafios para as aeronaves remotamente pilotadas

Por Isabela Rivato, bióloga e analista de uso correto e seguro do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg), Soraia de Pinho, farmacêutica e analista de assuntos regulatórios do Sindiveg e Fábio Kagi, engenheiro agrônomo e gerente de relações institucionais e regulatório do Sindiveg.

O setor agrícola nacional é uma importante atividade da economia brasileira em razão do aumento de suas safras, que nos últimos três anos vêm alcançando recordes, tendo seu sucesso na produtividade e rentabilidade graças ao clima tropical do Brasil.

Para manter a alta produtividade, os agricultores precisam usar de meios para combater pragas, doenças e plantas daninhas que, em nossos país, têm seu ciclo de vida favorecido pelo clima tropical. Dentre as ferramentas mais utilizadas para proteção das lavouras estão os defensivos agrícolas, que, geralmente, são aplicados por meio de pulverização.

Para se ter uma ideia da importância dos defensivos, basta dizer que, em virtude do agravamento do ataque de insetos, da dificuldade para controle de doenças e do aumento das infestações de plantas daninhas, os agricultores brasileiros aplicaram esse tipo de insumos em 741,278 milhões de hectares apenas no primeiro semestre deste ano, de acordo com estatísticas do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg). O número é maior que o registrado no período de janeiro a junho de 2021.

Entre as diversas formas para realizar as aplicações dos defensivos agrícolas, os equipamentos aéreos – categoria que inclui os drones – são destaque nos últimos anos, pois estão se tornando uma ferramenta indispensável para a agricultura competitiva, sobretudo nas culturas de grande interesse econômico, dado seu elevado nível de automatismo e precisão.

A aviação agrícola é uma atividade regulamentada por Lei Federal (Decreto-Lei Nº 917, de 1969) e submetida à fiscalização do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), que está em constante evolução.

As aeronaves remotamente pilotadas – ou “Remotely Piloted Aircrafts” (RPAs), um termo em inglês que foi definido pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) como correto para tratar esses equipamentos –, conhecidas popularmente como “drones”, vêm ganhando espaço no cenário agrícola atual, não só no território, mas em todo o mundo.

Os RPAs são definidos, de acordo com a Anac, como aqueles equipamentos em que não há piloto a bordo da aeronave, mas que são controlados remotamente. São ferramentas atrativas para os produtores rurais pois diminuem o risco de exposição do trabalhador rural, além de permitir a pulverização de talhões com formatos irregulares, com dificuldade de acesso ou até mesmo com elevada declividade, em que tanto a pulverização com pulverizadores terrestres, quanto a pulverização com aviões ou helicópteros teriam dificuldade de operar.

Para estabelecer as regras para operação de RPAs destinadas à aplicação de defensivos agrícolas e afins, em setembro de 2021, o Mapa publicou a portaria 298 que trata as RPAs como equivalentes à aplicação área tripulada, permitindo então que produtos que tenham aplicação aérea registrados em bula possam ser aplicados também por drones. Além disso, a portaria traz aspectos relacionados as áreas de bordadura, descarte de resíduos, segurança operacional e registro de dados e utiliza a sigla ARP (que significa Aeronave Remotamente Pilotada) para tratar de drones.

A portaria estabelece ainda que o operador de RPAs deverá manter registro dos dados relativos a cada aplicação de produtos, com informações como altura do voo, volume e dosagem aplicada, tipo e/ou modelo de ponta de pulverização utilizada, tipo de atividade (aplicação de agrotóxico, de fertilizante, de inoculante, de corretivo, semeadura e outros), dados meteorológicos, aeronave utilizada (identificação da ARP, conforme determinado Anac) e outros.

Contudo, vale lembrar que essas não são as únicas exigências para as aplicações de insumos agrícolas com ajuda drones. A presença de um profissional responsável pela operação, também são obrigatórias para a realização das aplicações, mesmo que o voo seja automatizado.

Esses profissionais devem ser maiores de 18 anos de idade e possuir Curso para Aplicação Aeroagrícola Remota – o chamado “CAAR” – que seja homologado pelo Mapa e oferecido por uma entidade de ensino registrada. Somente assim será possível exercer a atividade.

Ainda que a tecnologia embarcada nos drones seja de ponta, muitos pesquisadores e especialistas do ramo de defensivos agrícolas encontram desafios para essa nova fase da pulverização aeroagrícola.

Um deles é a dificuldade no preparo da calda, em razão da problemática em agitar o líquido, visto que os drones não possuem agitadores em seu interior, tornando a utilização de adjuvantes crucial para que a calda tenha boa consistência para evitar assim o entupimento de pontas. Além disso, o volume de calda presente no tanque dos drones é menor, dificultando a mistura dos produtos, o que pode levar à falta de uniformidade e incompatibilidade de produtos.

Além de não possuirem agitadores, os drones geralmente não possuem manômetro. Dessa forma, não é possível medir a pressão com que a calda vai ser empurrada nos pequenos orifícios das pontas.  A ação de empurrar o líquido sob forte pressão nos orifícios das pontas de pulverizar é o que fraciona a calda em milhares de partículas, criando as gotas. Quando a pressão é excessiva, o espectro de gotas é modificado, aumentando a possibilidade de geração de gotas muito finas, as mais propensas à deriva.

A aplicação com drones exige um preparo e processo de tomada de decisão diferente, pois, apesar da alta tecnologia embarcada e as aplicações rigorosamente controladas, esta ainda é uma nova forma de aplicação, o que exige que as tanto as RPAs como toda a tecnologia de aplicação evoluam de maneira rápida e tragam consigo o máximo de benefícios ao agronegócio e à sociedade.

Treinamentos são fundamentais

Para que o uso correto e seguro dos insumos agrícolas por meio de drones seja uma realidade, é preciso ampliar o conhecimento sobre o assunto. E esse conhecimento deve ser absorvido não apenas técnicos que atuam nas propriedades rurais, mas por todos os agricultores e demais profissionais envolvidos no ciclo de produção. Algumas iniciativas do tipo já estão disponíveis e são gratuitas. A Plataforma de Treinamentos On-line do Sindiveg (www.sindiveg.org.br/cursos), por exemplo, já conta com seis módulos e mais de 15 mil inscritos, fornecendo informações de qualidade e certificação.

Referências bibliográficas

ANAC. Requisitos gerais para aeronaves não tripuladas de uso civil. 2017. Disponível em: https://www.anac.gov.br/assuntos/legislacao/legislacao-1/rbha-e-rbac/rbac/rbac-e-94/@@display-file/arquivo_norma/RBACE94EMD00.pdf. Acesso em: 23 set. 2022.

CARVALHO, F. K., et al. Entendendo a tecnologia de aplicação: aviões, helicópteros e drones de pulverização. 2. ed. rev. ampl. Botucatu: FEPAF, 202. 96 p.

MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO – MAPA (Brasília). Estabelece regras para operação de aeronaves remotamente pilotadas destinadas à aplicação de agrotóxicos e afins, adjuvantes, fertilizantes, inoculantes, corretivos e sementes. Portaria nº 298, ed 182, pág.14, de 22 de setembro de 2021. Disponível Oficial da União. 24 set. 2021. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-mapa-n-298-de-22-de-setembro-de-2021-347039095. Acesso em: 23 set. 2022.